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quinta-feira, 5 de julho de 2012

BULIMIA & ANOREXIA


UM TRANSTORNO PARA DOIS GÊNEROS
“Estou acima do peso e quero emagrecer”. Muitas mulheres podem se reconhecer ao ler essa frase, geralmente quando estão à procura do corpo que julgam perfeito, com índices de gordura bem abaixo do padrão considerado saudável pela medicina. No entanto, especialistas alertam que o fascínio pelo peso ideal é um problema grave também entre os homens.

“O número de pacientes do sexo masculino vítimas de transtornos alimentares, como bulimia e anorexia nervosas, vem crescendo a cada ano”, afirma Raphael Cangeli Filho, coordenador de psicologia do grupo de homens do Ambulatório de Bulimia e Transtornos Alimentares (Ambulim) do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (IPq-USP).

A afirmação do especialista se baseia na experiência clínica, uma vez que não há números globais de incidência. O Ambulim iniciou um atendimento específico a homens em 2006, recebendo 30 pacientes. Desde então, 104 já passaram por ali, e agora, os homens já são um em cada cinco atendidos. “Cresceu a busca pelo tratamento: o homem passou a se perceber doente com mais facilidade e a procurar ajuda”, diz Cangeli. Vale acrescentar que, no Programa de Distúrbios Alimentares da (Proata) Universidade Federal Paulista (Unifesp), que faz trabalho semelhante, a participação masculina também é crescente e chega a 10%.

Diferenças – “Bulimia e anorexia são transtornos alimentares, classificados como doenças mentais", explica a psiquiatra Angélica de Medeiros Claudino, coordenadora do Proata/Unifesp. Homens e mulheres sofrem com os problemas, mas de maneiras diferentes. A chamada “distorção corporal” – pela qual a pessoa se enxerga bem mais gorda do que de fato é –, por exemplo, é bem mais amena entre os homens anoréxicos, que não se percebem tão diferentes do que realmente são. As mulheres, por sua vez, não aceitam o corpo, por mais magras que estejam, mas são menos resistentes ao tratamento.

“Eles costumam procurar tratamento quando já estão em condições de internação”, diz Cangeli. O psicólogo diz ainda que os homens são mais eficientes para esconder os sintomas, pois ganham massa corporal com facilidade ao praticar exercícios físicos.

Público alvo – Os especialistas que acompanham a evolução dos distúrbios avaliam que os problemas já se espalham por diferentes grupos masculinos. “Além dos rapazes ligados a profissões que se preocupam muito com o corpo, como modelos, estilistas e jockeys, também atendemos muitos homens, solteiros e casados”, acrescenta Cangeli. “É um público bem variado”.
Os homossexuais formam outro grupo em que os transtornos podem ser percebidos. “Eles se preocupam muito com a imagem do corpo”, explica Angélica Claudino.

Anorexia nervosa
Bulimia nervosa
O que é

Transtorno alimentar caracterizado por um grande temor de ganhar peso, ainda que o paciente esteja muito abaixo do peso ideal. Ele se impõe, então, uma rígida dieta de restrição alimentar.

Transtorno alimentar caracterizado pelo ciclo formado por uma etapa de grande ingestão de alimentos e outra de compensação ou purgação: força-se o vômito ou ingere-se laxantes e/ou diuréticos para eliminar a comida. Existe também o bulímico não purgativo, que faz exercícios físicos obsessivamente e passa por períodos de jejum. Nos dois casos, também há temor de ganhar peso.

Causas

Em 70% dos casos, há predisposição genética. Contribuem ainda a chamada cultura da "beleza magra" e o estímulo à busca do corpo ideal.

Sintomas

Queda de cabelo e da temperatura do corpo, ressecamento das unhas, perda de tecidos ósseos e irregularidades cardíacas. Nas mulheres, a doença pode desencadear interrupção do ciclo menstrual e infertilidade A falta de nutrientes leva à osteoporose, irregularidades cardíacas, queda de cabelo e da temperatura do corpo e ressecamento das unhas, além das dores abdominais, inflamações anais e descontrole intestinal.

Perda de peso

O paciente sempre emagrece O paciente nem sempre emagrece. Ainda que ele induza o vômito ou use laxantes e/ou diuréticos, entre 30% e 50% da alimentação são absorvidas pelo corpo.

Consequências

O anoréxico pode morrer em estado de desnutrição. Desidratados, os pacientes sofrem perda de eletrólitos, principalmente potássio, fundamental para o funcionamento muscular e cardíaco O bulímico pode morrer devido aos métodos purgativos – há pacientes que chegam a vomitar 15 ou 20 vezes por dia –, que estimulam a desidratação e perda de eletrólitos.
Como identificar uma pessoa com bulimia ou anorexia nervosas
SINAIS DE ALERTA
Sinais mais visíveis
 não se alimenta na frente de outras pessoas: diz que já comeu ou que ainda vai comer

 mesmo muito magra, age como estivesse sob dieta, controlando as calorias dos alimentos que ingere e revelando medo excessivo de engordar

 faz exercícios compulsivamente e mostra-se culpada quando não se exercita

 dissimula a aparência, usando roupas folgadas e penteados que escondem a proeminência das maçãs do rosto

 afasta-se das pessoas, tornando-se desconfiada e agressiva

 apresenta sintomas de desnutrição: tontura, desmaio, fadiga, sono ou insônia e inchaço no corpo, especialmente nas pernas

 emagrecimento súbito, sem motivo aparente

Sinais menos visíveis
 vômitos após as refeições: visitas sistemáticas e demoradas ao banheiro depois de comer podem denunciar a prática

 uso de laxantes e diuréticos: queixas de cólicas abdominais, inflamações anais ou descontrole intestinal dão os sinais

Fonte: Marco Antonio De Tommaso, psicólogo e membro da Associação Brasileira para Estudos sobre a Obesidade.

DEPOIMENTOS DE PACIENTES
Anorexia nervosa
     Gilson Pereira Júnior, 27 anos, vendedor – São Vicente (SP)
Eu tinha 17 anos e era gordinho. Tenho 1,70 m de altura e, na época, pesava 90 kg. Resolvi emagrecer por conta própria e, em dois meses, perdi 34 kg. Tomava diuréticos e remédios para emagrecer. Além disso, ficava seis dias só bebendo água e, no sétimo, comia alguma coisa para não ficar completamente sem forças. Nessas refeições, ingeria coisas bem leves, como salada, carne branca e arroz, mas em quantidades bem pequenas.
Tinha medo de engordar – e ainda tenho. Só depois de um ano é que percebi que estava realmente doente. Procurei um psiquiatra e parei a dieta. Engordei 4 kg, cheguei a 60 kg com ajuda da minha família. Mas, em seguida, voltei a emagrecer. Estava me sentindo horrível. Minha família quis me internar em um hospital especializado em transtornos alimentares, mas eu não queria. Para mim, seria muito vergonhoso ser internado. Então, decidi fazer musculação para manter o peso e não engordar demais. Fui ganhando músculos. Hoje, peso 75 kg, mas quero emagrecer de novo, porque ainda penso como um anoréxico.
     João Paulo Olisan, 20 anos, estudante – Rio Branco (AC)
Meu sonho sempre foi ser modelo e ator, mas fui uma criança gordinha: com 1,71 m, cheguei a pesar 80 kg. Em 2006, comecei um regime e consegui perder 12 kg por minha conta. Foi aí que começaram os sintomas anoréxicos: não queria comer mais nada porque tinha medo de engordar tudo o que havia perdido. Eu comia muito pouco, pulava refeições, não saía do apartamento para não comer fora, insistia em ficar sozinho para
não cair em tentação. Consegui, assim, perder mais 8 kg e cheguei aos 60 kg – minha meta inicial. Mas o medo de engordar continuou. Não parava de emagrecer e cheguei a pesar 58 kg, o mesmo que eu tinha aos 12 anos. Quando cheguei aos 50 kg, minha família me levou ao médico. Comecei tratamentos contra o TOC (transtorno obsessivo compulsivo) e a depressão e engordei 7 kg. Hoje ainda sou escravo do laxante e quero perder 2 kg, mas não sou mais depressivo e tenho vontade de viver.
   
Bulimia nervosa
     Heivid Barbosa Santos, 23 anos, gerente financeiro – Belo Horizonte (MG)
Aconteceu quando eu tinha 16 anos. Fui infectado por uma bactéria, que me deixou de cama por vários dias. Por causa desse problema, tudo o que eu comia pesava no meu estômago e eu acabava vomitando. No começo, não era forçado, foi consequência da doença. Quando melhorei, tinha a impressão de que qualquer tipo de comida me faria mal e, a parti daí,
comecei a forçar o vômito. Emagreci 10 kg em duas semanas. Passei um tempo só comendo gelatina e, quando comia outra coisa, mesmo que fosse bem pouco, colocava o dedo na garganta e vomitava. Eu sabia que estava doente, mas não sabia que era bulimia. Comecei a ler sobre o assunto e fui recuperando meu peso aos poucos. Tive algumas recaídas, mas hoje, com 1,89 m de altura e 95 kg, já não tenho mais esse tipo de reação depois de comer.